Ó fortuna cruel, ó dura sorte,
trabalho que me pôs em tal estado
que não quero já ser desenganado
nem tem cura meu mal senão a morte.

És cego, dize, Amor? Porque tão forte
te mostras contra quem tão maltratado
anda de te servir, e magoado
traz o coração ferido de teu corte?

Mas já que não quer mal senão tratar-me
a cruel fortuna minha, ó Amor,
deixa-me sequer poder queixar-me.

Porque, em tanto trabalho e tanta dor,
mal poderei sem isto consolar-me,
já que de ti não quero outro favor.

Luís Vaz de Camões
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