A ũa dama que se chamava ana.

MOTE

A morte, pois que sou vosso,
não na quero; mas se vem,
há-de ser todo o meu bem.

GLOSA

Amor, que em meu pensamento
com tanta fé se fundou,
me tem dado um regimento
que, quando vir meu tormento,
me salve com cujo sou.
E com esta defensão,
com que tudo vencer posso,
diz a causa ao coração:
não tem em mim jurdição
a morte, pois que sou vosso.

Por experimentar um dia
Amor se m' achava forte
nesta fé, como dizia,
me convidou com a morte,
só por ver se a tomaria.
E como ele seja a cousa
onde está todo meu bem,
respondi-lhe como quem
quer dizer mais e não ousa:
não a quero, mas se vem...

Não disse mais, porque então
entendeu quanto me toca.
E se tinha dito o não...
muitas vezes diz a boca
o que nega o coração.
Toda a cousa defendida
em mais estima se tem:
por isso é cousa sabida
que perder por vós a vida
há-de ser todo meu bem.

Luís Vaz de Camões
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