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Sobre esta praia me inclino. Praias sei; Me deitei nelas, fitei nelas, amei nelas com os olhos pelo menos os deitados corpos nus côncavos da areia ou dentre as pedras desnudos em mostrar-se ou consentir-se ou em tombar-me intentos como o fogo do sol em dardos que se chocam brilham em lâminas faíscas de aço róseo e duro. Do Atlântico ondas rebentavam plácidas e o delas ruído às vezes tempestade que em negras sombras recurvava as águas me ouviram não dizer nem conversar mais do que os gestos de tocar e ter na tépida memória as flutuantes curvas de ancas e torsos, negridão de pêlos, olhos semicerrados, boca entreaberta, pernas e braços se alongando em dedos. Aqui é um outro oceano. Um outro tempo. Miro dois vultos na silente praia pousada rente à escarpa recortada abrupta que só trechos de areia lhes consente: dois corpos lado a lado corno espadas frias. Ainda que desça a perpassar recantos onde se acolherão mais corpos nus, é um outro oceano, um outro tempo em outro diverso em gente organizado mundo. Ambíguos corpos, sexos vacilantes, um cheiro de cadáver, que ao amor não feito concentra de tristeza e de um anseio de matar ou ser morto sem prazer nem mágoa. Aqui mesmo de olhar-se um qual pavor gelado pinta de palidez o rosto que sorria, o corpo que se adiante ao gesto desenhado. E nem mesmo de outrora e de outros mares se atrevem a deitar-se imagens soltas que uma vez alegria acaso tenham sido. Se aqui nasceram deuses, nada resta deles senão a luz mortal de corpos como máquinas de um sexo que se odeia no prazer que tenha e mais é de ódio ao ver-se desejado.
In Sobre esta Praia... Oito meditações à beira do pacífico
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