Sei que desprezarias, não somente
A mim, mas ainda mais o meu amor,
Se eu ousasse, numa hora
Dizer-te quem tu és p’ra a minha dor.
Levo comigo, inútil confidente
Do meu próprio martírio,
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Quantas vezes, falando com tuas falas,
Me esqueço delas de pensar em ti;
Olhas—me, estranhas, e, ofendido, calas.
E não sei explicar porque não te ouço.
Busco desculpas □
Mas a razão □ não posso.
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Sei que não és quem quero que tu sejas.
Sei que és como outros.
Vulgares bocas de mulheres beijas
E eu só o sonho vão da tua boca.
Nada de mim, salvo o amor vão, te toca
No corpo, e nem sequer não me desejas;
Pois tudo ignoras que há entre mim e a louca
Ideia que me faço de ti □
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Ah, se soubesses com que mágoa eu uso
Este terror de amar-te, sem poder
Nem dizer-te que te amo, de confuso
De tão senti-lo, nem o amor perder.
Se soubesses com que ódio a não saber
Falar-te do que quero, a mim me escuso.
Se soubesses? E se o soubesses? Quê?
Que gesto teu p’ra mim melhoraria
Este mau-estar de mim comigo e o amor?
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Sei eu ao certo, se pudesse ter-te
Que quereria ter-te? Se eu ousasse
O que sinto por ti um dia dizer-te
E a tua surpresa amiga o aceitasse,
Sei eu sim, se não ficaria inerte,
E sem que a outra ousadia me faltasse,
De, tendo a tua promessa, ir colher-te
Ao ramo que a tua □ aproximasse?
Que sei! que sei! há tanta gente em mim!
Tanto ímpeto perdido e contradito.
Sou a meu próprio ser tão pouco afim
Que talvez a maior tortura fosse
Aceitares-me e eu ver-me, atado e aflito,
Incapaz do último acto.
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Ah, como invejo, se te às vezes sonho,
Os sedutores
Os que ousam, como os outros mais normais,
Dizer, propor,□
Que não sou belo sei; outros também
Desses não o são mais, e ousam falar
O amor que têm, e querem que lhes tenham.
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Um dia, num acaso da conversa
Que houve entre nós, entre a tua mente e eu todo,
Falámos, já mal sei de que □ modo
Desta □
Do vício de Shakespeare □
E eu que ansiava esse momento contigo,
Para um momento, levemente, aos poucos,
Dar a entender minh’alma sem perigo,
Porque talvez..., quem sabe... como sei?
Ah, fui traidor a mim
E com a voz sem mim só condenei.
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No exílio para onde, sem querer
Nem o saber, me expulsas, e, onde vivo
Só da tua imagem, tenho mais sofrer
Que o verdadeiro exul
Ele, da pátria longe, □
Eu sou de ti exul perto de ti.
Quando falo contigo amigamente,
Estamos inimigos. Se sorri
A tua boca vejo o seu sorriso
Que é para mim, mas não é meu
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Antinoo, Ganimedes, Batilo, ora
Um ora outro □
De ti me refugio com Antinoo
E a Ganimedes canto porque existes.
O amor é grande e fere quer procure
De homem ou mulher, mulher ou homem.
Anteros! Cerca a tua campa antiga
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Não sei que intimidade ter contigo.
Só sei aquela ter que não me basta.
Falo-te em voz igual e boa de amigo —
E ah! quanto co’a amizade o amor contrasta!
Dói-me a alma cada vez que o que te digo
Do que quero dizer-te se me afasta,
E se vou a dizê-lo, como a um perigo
Fujo, e a oculta □ em mim se arrasta.
Porque não fazes um gesto casual
Em tal dia, em tal hora, que eu possa
Ousar?
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Põe, amor, sobre a fronte aquelas rosas
Que Catulo ou Horácio cantariam
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Quê? Há-de ser só justo e natural
Cantar o amor que p’ra a mulher impele?
Que mal há, se é na alma há bem ou mal,
Em cantar outro amor que não aquele?
Contigo nada ouso; calo, e fale
Por mim a escrita voz □
Mas não tão pouco ouso que me cale
Comigo, e em escrita voz me não rebele.
Por que vício da mente hei eu vergonha
Em te cantar? Que influxo d’outrem vindo
Faz com que eu core a sós, quer me suponha
Amando-te ou dizendo-o, ou só sentindo?
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Se te amo como a homem ou mulher?
Não sei; se eu o soubesse, não te amava.
O que é que de ti □ minh’alma quer?
Ou quereria □