MOTE

Esconjuro-te, Domingas,
pois me dás tanto cuidado,
que me digas se te vingas:
viverei menos penado.

VOLTAS

Juravas-me que outras cabras
folgavas de apacentar;
eu, por não me magoar,
fingia que eram palavras.
Agora d' arte te vingas
d' algum meu doudo pecado,
qu' inda [que] queiras, Domingas,
não posso ser enganado.

Qualquer cousa busca o seu:
a fonte vai para o Tejo,
e tu para o teu desejo
por te vingares do meu.
De mi te esqueces, Domingas,
como eu faço do meu gado.
Praza a Deus que, se te vingas,
que moura desesperado.

Na fantasia te pinto;
falo-te, responde o monte;
busco o rio, busco a fonte,
endoudeço e não o sinto.
«Domingas!” »no vale brado.
Responde o eco: «Domingas!»
E tu inda te não vingas
de me ver doudo tomado?
 

Luís Vaz de Camões
[ESCONJURO-TE DOMINGAS]
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