Esta inconstância de mim próprio em vibração
É que me há-de transpor às zonas intermédias,
E seguirei entre cristais de inquietação,
A retinir, a ondula… Soltas as rédeas,
Meus sonhos, leões de fogo e pasmo domados a tirar
A torre d''Ouro que era o carro da minh' Alma,
Transviarão pelo deserto, moribundos de Luar —
E eu só me lembrarei num baloiçar de palma...
Nos oásis depois hão-de-se abismar gumes,
A atmosfera há-se ser outra, noutros planos;
As rãs hão-de coaxar-me em roucos tons humanos
Vomitando a minha carne que comeram entre estrumes...

*

Há sempre um grande Arco ao fundo dos meus olhos...
A cada passo a minha alma é outra cruz,
E o meu coração gira: é uma roda de cores...
Não sei aonde vou, nem vejo o que persigo...
Já não é o meu rastro o rastro d'oiro que ainda sigo...
Resvalo em pontes de gelatina e de bolores...
— Hoje a luz para mim é sempre meia-luz....

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As mesas do Café endoideceram feitas Ar...
Caiu-me agora um braço... Olha lá vai ele a valsar,
Vestido de casaca, nos salões do Vice-Rei...
(Subo por mim acima como por uma escada de corda,
E a minha Ânsia é um trapézio escangalhado...)


Lisboa, maio de 1914
Mário de Sá-Carneiro
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