1.
Sonho sem fim nem fundo.
Durmo, fruste e infecundo.
Deus dorme, e é isso o mundo.
Mas se eu dormir também
Um sono qual Deus tem
Talvez eu sonhe o Bem —
O Bem do Mal que existe.
Esse sonho, que avisto
Em mim, chama-se o Cristo.
2.
Não foi em cruz erguida
Num calvário da vida,
Mas numa Cruz vivida
Que foi crucificado
O que foi, em seu lado,
Por lança golpeado.
E desse coração
Agua e sangue virão,
Mas a Verdade não...
3.
Só quando já descido
De a onde foi subido
Para ser escarnecido,
Seu corpo for baixar
Onde se há-de enterrar
O haverei de encontrar
Água o seu ser ausente,
Sangue o que há de presente
Na ausência, eternamente.
4.
Desde que o mundo foi
No mundo à alma dói
O que ao mundo destrói,
Desde que a vida dura
Tem a vida amargura
De ser mortal e impura.
E assim na Cruz se pôs
A vida, para que a sós
Seja o melhor de nós.
5.
O túmulo fechado
Aberto foi achado
E vazio encontrado.
Meu coração também
É o túmulo do Bem
Que a minha Alma não tem.
Mas há um anjo a me ver
E a meu lado a dizer
Que cegue e saiba crer.