Coitado, que em um tempo choro e rio,
espero, temo, quero e aborreço.
juntamente me alegro e entristeço,
de ũa cousa confio e desconfio.

Avoo sem asas, estou cego e guio,
e no que valho mais menos mereço;
calando, dou vozes; falo e emudeço,
nada me contradiz e eu aporfio.

Queria, se ser pudesse, o impossível;
queria poder mudar-me e estar quedo,
usar de liberdade e ser cativo.

Queria que visto fosse e invisível;
queria desenredar-me, e mais me enredo:
tais são os extremos em que triste vivo.

Luís Vaz de Camões
[COITADO QUE EM UM TEMPO CHORO E RIO]
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