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Anda com a minha alma ao colo, Como se fosse uma criança, Uma tristeza, um desconsolo, Um amor ao que não se alcança...
Em que longínqua ilha deserta Poderei ser o rei que fui? Ao pé de que rio que flui Ao pé duma janela aberta?
Essas horas ao pé da água Seriam tão consoladoras Das tristes, lentas, tardas horas Que florescem na minha mágoa...
Vozes de crianças nos parques... Arcos velozes nos jardins... Não quero, ó alma, que tu arques Com a dor nítida dos Fins...
Quero antes que, pendente duma Janela ao pé do rio lento, Deixes cair teu pensamento No rio lento sem espuma...
E assim o percas, assim vá Por esse rio, além da vista, À deslizada e alvar conquista Das margens que aqui não há.
Teus brincos velhos, tua avó Usava-os e era tão feliz... Como o meu coração está só... Não o acompanha o que tua voz diz.
Meus olhos vão na água vista Sob essa janela sonhada... Meus olhos, esse ver que dista De mim como eu daquela estrada
Perdida que podia, ó alma, Conduzir-me ao teu gesto lento, E casar-me em teu pensamento Com a longínqua e última calma.
Mares distantes, ilhas pondo Flores e florestas no mar... Ó grande solidão lunar Entre as cousas que vou supondo!...
Maturadas as confidências Que fiz um dia ao teu requinte, Guardo minha alma por acinte E a espada sangra entre as consciências...
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1915
In Poesia 1902-1917
, Assírio & Alvim, ed. Manuela Parreira da Silva, Ana Maria Freitas, Madalena Dine, 2005
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