|
Vi um dia uma cómica gigante Tentando comer qualquer coisa enorme, Sozinha, num festim alucinante, Coisa, como pedra, dura e informe. Mas para a sua boca era tão imensa Que, na sua avidez assim intensa, Dobrava o esforço de seu desejo nulo; E seu abocanhar amplo, impotente, Teria feito rir, não fosse o riso Suspenso por isto ser pungente. Nesta orgia oca, inconsequente, Eu a vi e, notando o seu sofrer, Perguntei: «O que é essa coisa imensa Que, sem sucesso, lutas por comer?» E ri, grosseiro, tranquilamente. Ela chorou e, entre lágrimas, disse: «Esta comida que, de grande, se esgueira Sempre à minha boca já dorida É a Beleza una e toda inteira.» Olhei para ela e já não me ri, Mas antes chorei, pois entendi.
1907
In Poesia
, Assírio & Alvim , edição e tradução de Luisa Freire, 1999
|